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  Raridades de Ary saem em seis CDs da Revivendo


Para marcar o centenário de Ary


Ary Barroso supera a marca dos cem anos


Duas estátuas


A ala Ary-Garrincha


Aquarela de Ary


O centenário de Ary


Noções, lições e emoções de Ary Barroso (1)


 
 
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  Raridades de Ary saem em seis CDs da Revivendo
Lauro Lisboa Garcia - 2004-04-20 - Estadão

É só prestar atenção na abertura ou depois da vitória conquistada pelos atletas brasileiros nos eventos esportivos, em que se executa o Hino Nacional. Já virou piada: ninguém sabe de cor a letra rebuscada. O compositor mineiro Ary Barroso (1903-1964), fanático por futebol e também locutor esportivo, adoraria que sua Aquarela do Brasil ecoasse nos gramados, como tema oficial da pátria de chuteiras. Essa todo mundo sabe. Sua composição mais patente até ganhou cores de outras bandeiras em um sem-número de gravações, das mais esdrúxulas às mais emocionadas. Seis delas podem ser comparadas entre as 138 faixas de Ary Barroso - Nossa Homenagem - 100 Anos, do selo Revivendo, coleção dividida em dois volumes, cada um com três CDs. A brejeira obra-prima aparece na voz de Francisco Alves (gravação original, de 1939), Anjos do Inferno (1940), Sílvio Caldas (1942), 4 Azes e 1 Coringa (1947), Jorge Goulart (1956), e em versão instrumental com a Orquestra de Zacarias (1943).

A primeira faixa de cada CD traz gravações raras de locuções de Ary Barroso no rádio, sempre divertidas. Entre elas, a história da gaita inspiradora da marchinha carnavalesca que se tornou prefixo dos programas esportivos da Rádio Tupi, do Rio, da qual Ary foi contratado a partir de 1939. Além do habitual cuidado com a ficha técnica, as datas das gravações, dados biográficos e curiosidades sobre algumas composições, os encartes trazem mais histórias envolvendo Ary com o futebol.

Segundo o historiador Sérgio Cabral, em seu livro No Tempo de Ari Barroso, seria difícil apontar uma única fase como a mais importante da carreira do compositor e radialista, apesar de situar 1939 como o ano em que sua história deu uma guinada. Principalmente pelo lançamento da ufanista Aquarela. Naquele ano também fizeram sucesso Na Baixa do Sapateiro, Camisa Amarela, Maria (parceria com Luís Peixoto), No Rancho Fundo (com Lamartine Babo). Com exceção de Camisa, esses clássicos estão na coleção em gravações históricas.

Apesar de incluir outras jóias - Risque, Isto aqui o que É?, Como 'Vaes' Você?, Rio de Janeiro, Pra Machucar Meu Coração, É Luxo só, Boneca de Piche e Na Batucada da Vida -, o grosso da coleção é o lado mais obscuro de Ary.

As canções citadas foram as mais regravadas porque estão entre as melhores, mas há muito o que descobrir entre seus sambas sincopados, marchas bem-humoradas, valsas amorosas e canções de grande beleza harmônica.

Fugindo do óbvio da meia dúzia de sucessos que traz a maioria das coletâneas, a coleção da Revivendo garimpa peças raras, como Duro com Duro, samba lançado por João Petra em 1964. Um trecho da letra diz: Sei que você tem prazer/ Vendo alguém padecer/ Eu também sou assim/ De maneira que a nossa união seria um horror/ Não me diga que não/ Pois duro com duro/ Não faz bom muro. Da parceria com Lamartine Babo surgem outras singelas raridades, como E o Samba Continua..., gravada por Almirante (1934), e Palmeira Triste, por Elisa Coelho (1932).

Grande parte do repertório foi lançada pelos melhores intérpretes dos anos 30, 40 e 50, como Francisco Alves, Carmem Miranda, Odete Amaral, Aurora Miranda, Déo, Mário Reis, Aracy Cortes, Silvio Caldas. A maliciosa marcha Eu Dei, recentemente regravada de forma irretocável por Maria Alcina com o projeto eletrônico Bojo, foi lançada por Carmem em 1937. Entre outras dezenas de curiosidades estão a marchinha natalina Meu Natal, por Francisco Alves, o samba Grand Monde do Crioléu (1957), por Marlene, o samba-canção Em Noite de Luar, invulgar parceria de Ary com Vinicius de Moraes, registrada por Ângela Maria em 1962, e o poético samba Olha a Lua (1936), com o Bando da Lua.

Esta última é uma das 316 gravações originais da obra completa de Ary, que compõem o ambicioso projeto de Omar Jubran. A exemplo do que fez com Noel Rosa, o pesquisador foi atrás da primeira gravação de todas as composições do autor e pretende reuni-las numa caixa de CDs. O trabalho de pesquisa está concluído e 50% do material já foi remasterizado, segundo ele. Só falta apoio financeiro para bancar a realização. "A gravadora Velas, que lançou a coleção de Noel, está com as portas abertas, mas sem patrocínio fica inviável", observa Jubran. Ele conta que, aproveitando o centenário de nascimento de Ary em novembro dde 2003, enviou a proposta a várias empresas privadas e órgãos governamentais. "Tudo que ouvi foram cumprimentos pela iniciativa. Ora, como diria Adoniran Barbosa, já estou cheio de homenagens."

Se os patrocinadores não se entusiasmaram nem com a importância da efeméride de Ary, talvez demore mais 13 anos para Jubran concretizar o projeto, tempo que levou para concluir o de Noel. Ele se confessa desanimado com a situação e nem sabe se vai ter condições (ele é professor de Biologia) de começar a tocar o próximo empreendimento, sobre Lamartine Babo. "Noel, Ary e Lamartine são os grandes pilares da música brasileira. Eles têm coisas magníficas de alto teor artístico, que merecem ser recuperadas e conhecidas." Enquanto isso, vai-se digerindo o feijão-com-arroz de sempre. Exceto por iniciativas como a da Revivendo.