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  Meu caro A.R.S.
Ary Barroso - 0000-00-00

Meu caro A.R.S.

Mandaram-me o número de "O Cataguases" com a sua opinião sobre meu "temperamento"! Não é meu intuito, ao enviar-lhe estas linhas, contestá-la. Cada um faz de mim o juízo que entender. Meu objetivo é esclarecer certos detalhes do "incidente" que, talvez, lhe tivessem escapado. Senão vejamos:

a) Minha passagem por Cataguases não tinha por meta principal "ganhar dinheiro". Tanto que aceitei, sem discutir, as bases que me foram ofertadas pelo Sr. Cunha, do cinema. As únicas exigências que fizemos foram quanto à propaganda que deveria ser intensa e quanto ao nome da Prof.ª Lila Carneiro como "patronnesse" da festa.

Permaneci em Ubá seis dias. Chegando a Cataguases, fui visitar o Ginásio, onde me encontrei com o velho amigo Peixoto. Matei as primeiras saudades. Depois chamei o Antônio Mendes. Batemos um papinho. Nem um nem outro sabiam o que ia fazer no cinema, Quer dizer: não houve a propaganda que pedi.

As tabuletas que existiam eram pobres, ridículas e tortas. Com letras desbotadas, escritas em diagonal ou de baixo para cima, exigiam do transeunte verdadeira ginástica de pescoço para entende-las. Nem boletins. Nem jomal. Nem rádio. O "seu" Cunha é de morte. Vim ter notícia de que não haveria microfone três horas antes do espetáculo. Ordenei ao Ernâni que fosse resolver o assunto, "Seu" Cunha era o responsável. Ora, não ando com microfone no bolso.

"Seu" Cunha então providenciou o reparo. Com o Sr. Silva consegui um microfone muito antigo, muito ruim. Era, porém, um microfone. Bem ou mal, servia. O Ernâni, que entende do assunto, avisou-me que a coisa não ia bem e que poderíamos ficar na mão em pleno espetáculo. Que excelente expectativa, não acha, meu caro?

Deu-se o irremediável: pifou o microfone, provocando gargalhadas do público. Ora, um espetáculo não sou eu só; somos eu e o meu intérprete. Estava no pressuposto de que havia no cinema instalação de som. Daí ter pedido à Prof.ª Lila seu piano emprestado, pedido imediatamente aceito, demonstrando a ilustre maestra, uma vez mais, sua conhecida generosidade.

O público - muito e compreensivo, aliás - pagou para ouvir Ary Barroso e seu intérprete Ernâni Filho. Acontece que Vicente Celestino só há um e o Ernâni é cantor de rádio, de disco e de TV, onde se canta com microfone.

b) Na impossibilidade real de continuar dando ao público o que lhe prometera, resolvi interromper o espetáculo. Não ficaria bem, face ao desastre técnico insolúvel, ficar com a renda da bilheteria. Então achei por bem dividí-la entre as "Missões" e o Hospital. Fiquei bem comigo mesmo, com o público e com meus amigos que me prestigiaram. Tanto que, depois da "barafunda", fui para a residência do bom Antônio Mendes e lá tocamos e cantamos por mais de duas horas.

Conclusões:
1) O incidente não foi provocado por mim. Nele, fui, apenas, vitima.

2) Você, meu caro, precisa liderar uma campanha para obrigar o "seu" Cunha a fazer instalação de microfone no cinema. Nenhum artista de cartaz poderá ir a Cataguases com o microfone do Sr. Silva.

3) Você, meu caro, precisa liderar uma campanha para obrigar o "seu" Cunha a adquirir um piano. Nem todo mundo canta acompanhado de violão.

4) Você, meu caro, precisa liderar uma campanha para obrigar o "seu" Cunha a apresentar tabuletas mais bem feitas e menos ridículas.

5) Voltarei a Cataguases quando os clubes, autoridades, amigos assim o determinarem. Juro, porém, que antes perguntarei pelo microfone.