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Bilhete ao meu filho
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  Bilhete ao meu filho
Ary Barroso - 2004-06-29

"-Meu filho: venho acompanhando seu trabalho jornalístico sobre o desaparecimento de um dos mais ricos troféus do futebol brasileiro. Você tem sido metódico, sincero, imparcial e minucioso. Conquanto mal inicia seus passos pela estrada difícil do jornalismo, você, com essas reportagens, me deu a alegria de constatar sua capacidade e seu amor à carreira. Não se empolgue demasiadamente, porém. Nem se deixe amargar com certas resistências e muito menos acredite em tudo que o cerca. Seja reservado. Transforme as dificuldades em estímulo. Passe por cima das barreiras convencionais e não se deixe nunca respingar do ácido das falsas indiferenças. Seu programa deve ser o de elevar o seu jornal, respeitando suas gloriosas tradições e amando seus colegas, desde o contínuo ao chefe.

Não pense que sua busca atual seja simples aventura quixotesca. O mundo da quimera e do sonho, você o tem quando faz seus poemas e quando canta suas rimas. Poemas bonitos e rimas vigorosas. A "Taça Rodrigues Alves" é o símbolo desse outro mundo que você não conhecia e esta começando a conhecer: o mundo desportivo brasileiro. Estive nele vinte e tantos anos! Foram vinte e tantos séculos de contradições e espanto, de lutas e dissabores. É um mundo de monstros e de anjos. Misturados por artes do diabo. É um mundo de recalques e de vaidades, de complexos e de politiquice. Prepare-se para as grandes noites sem lua e sem estrelas! Use a máscara contra gases e vista roupa de amianto contra incêndios. Gazes da maledicência e da inveja. Incêndios do ódio e da perseguição. Não mude seu caráter, que foi temperado com sacrifício e nos altos fornos da mais requintada educação moral e cívica. Você me segredou estranheza ante a inércia da CBD, face a tão importante acontecimento. Não se impressione com isso. Em qualquer outro país do mundo, quando um homem como o dr. Osvaldo Gomes declarasse que a CBD empenhava troféus, a reação viria nos moldes dos grandes movimentos saneadores. Aqui, não aconteceu nada. Nem acontecerá. Porque não pode e nem deve acontecer. Você me pergunta porque. Não direi nada. Desejo que você faça, por si mesmo, a experiência. Esse mundo de monstros e de anjos é também um imenso laboratório. Laboratório de pesquisas que auxiliam muito a quantos se interessam por decifrar os escaninhos da alma humana. Pergunte, meu filho, ao dr. João Lira Filho os motivos de seu ostracismo voluntário, ele que teve o esporte pátrio nas mãos. Pergunte ao Antônio Avelar por que esta escondido em sua casa. Pergunte ao Vargas Neto o que lhe fizeram. Pergunte ao Rivadávia Corrêa Meyer o que ele guarda do tempo que perdeu no esporte. Pergunte ao almirante Palhares se pretende voltar à presidência da entidade carioca. Colha as respostas e escreva um evangelho.

Se você não obtiver nada de positivo nessa cruzada jornalística em busca da "Taça Rodrigues Alves" não se atormente. Guarde no seu cofre a série de seus escritos e toque para a frente. O mundo de monstros e de anjos não se modificará. Seu destino foi traçado nos infernos. Mantenha-se incólume e cumpra honradamente, para alegria de seus pais, com o seu dever."